sábado, 5 de junho de 2010

Mais uma do Bandeira...

Aproveitando que Brasília, com esse climinha, proporciona uma excelente época para as Festas Juninas, posto mais um texto de Manuel Bandeira. Autor dos meus prediletos, como a maioria sabe, merece espaço amplo, total. É impressionante a maneira como, neste poema, ele consegue falar da morte, de maneira tão bela, tão singela, eu diria...

Profundamente


Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.

Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci.

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.

(Manuel Bandeira)

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